Imaginava-se que o mais importante
num diálogo era o intercâmbio de palavras. Mas o Supremo Tribunal Federal
sugere, em nova e revolucionária compreensão, que duas pessoas podem atingir a
suprema comunhão por meio do silêncio. Em decisões antagônicas, o ministro
Marco Aurélio Mello, ao devolver o mandato a Aécio Neves, liberou o senador
para conversar com a Andréa Neves. Mas a Primeira Turma da Suprema Corte havia
proibido a irmã do senador de falar com outros investigados. Assim, Aécio tem
todo o direito de falar com a irmã, desde que ela cale a boca.
Noutra decisão, o ministro Edson
Fachin mandou soltar Rodrigo Rocha Loures, o homem da mala. Enviou-o para casa,
com tornozeleira. Permitiu que saia à vontade durante os dias de semana,
recolhendo-se ao domicílio entre 20h e 6h. Fachin atribuiu sua decisão à
necessidade de assegurar ao ex-assessor de Michel Temer “tratamento isonômico”
em relação a encrencados como Andréa Neves, que também fora transferida da
cadeia para a prisão domiciliar por decisão da Primeira Turma do Supremo.
O problema é que, no caso da irmã de
Aécio, o Supremo foi mais avarento na administração de sua generosidade.
Proibiu a investigada de sair de casa. Nada das escapulidas matinais e
vespertinas permitidas ao sujeito filmado recebendo a mala com pripina de R$
500 mil numa pizzaria de São Paulo.
Ao interpretar as mesmas leis de
forma tão diversa, os ministros do Supremo dão ao Judiciário uma aparência de
loteria togada. De resto, convulsionam a semântica. Quando confundem monólogo
com diálogo e tratamento desigual com isonomia, autorizam a plateia a suspeitar
que a Justiça vive uma crise de significado.
Por exemplo: Edson Fachin afastara
Aécio do exercício do mandato porque avaliara que, no Senado, ele poderia
obstruir a Justiça. Baseou-se em evidências de que o grão-tucano articulava a
troca do ministro da Justiça e a aprovação de leis para anistiar criminosos e
punir magistrados e procuradores. Marco Aurélio revogou a decisão do colega por
considerar, em essência, que afastar parlamentar é papel do Congresso, não do
Supremo.
Quer dizer: em tempos de crise
semântica, uma sentença do Supremo pode dizer qualquer coisa. Ou o seu
contrário.
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