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domingo, 10 de outubro de 2021

Negar absorventes a mulheres pobres faz da perversidade uma política pública

Durante o governo Bolsonaro, uma das principais atribuições do jornalismo é a de retratar a estupidez humana, convertendo notícia em testemunho da insensatez. É preciso imprimir na história todos os vestígios de desinformação e crueldade.

Há no trono de presidente um personagem capaz de vetar artigos de um projeto de lei que asseguravam a distribuição gratuita de absorventes para meninas pobres de escolas públicas, mulheres em situação de rua e presidiárias.

Pense só nisso por um instante. Esqueça todo o resto —o negacionismo da gripezinha, as rachadinhas, o orçamento secreto do centrão, os dólares do Posto Ipiranga no paraíso fiscal... Esqueça tudo isso.

Concentre-se no seguinte: em pleno século 21, há no Brasil algo como 6 milhões de adolescentes e mulheres que, sem dinheiro para o absorvente, são constrangidas a lidar com o sangramento menstrual na base do improviso. Usam de jornal velho a miolo de pão. E o presidente elevou o absurdo ao estágio de escárnio.

Bolsonaro alega que o projeto tem origem no PT. Tolice. A coisa foi aprovada na Câmara e no Senado. Sustenta que não foi indicada a fonte dos recursos. Lorota. O projeto anota que o dinheiro viria da rubrica orçamentária que banca a assistência primária no SUS e, no caso das detentas, do Fundo Penitenciário.

Nada que se equipare aos R$ 17 bilhões repassados secretamente à turma do centrão e seus assemelhados. Nada que se assemelhe ao malabarismo fiscal que levou Bolsonaro a escorar o seu Auxílio Brasil na arrecadação inexistente de uma reforma do Imposto de renda pendente de apreciação no Senado.

Não ocorreu a ninguém dizer a Bolsonaro "quem sabe no absorvente a gente não mexe!" Nenhuma voz se levantou para ponderar: "Presidente, uma em cada quatro mulheres não tem R$ 15 por mês para lidar dignamente com o ciclo menstrual.

Adolescentes perdem 45 dias de aula por ano." O mais trágico não é a indignidade, mas a conversão da perversidade em política pública. A insensibilidade mostra que o principal déficit do governo é mental, não fiscal. Não há outra alternativa, senão a do Congresso derrubar o veto presidencial. 

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